Pois é, pra quê? Dia Internacional dos Povos Indígenas

No dia 9 de agosto é celebrado o DIA INTERNACIONAL DOS POVOS INDÍGENAS. A data foi escolhida pela Assembléia Geral das Nações Unidas, em 1994, no contexto da  “Década Internacional dos Povos Indígenas do Mundo” (1995-2004). O objetivo era homenagear e valorizar a diversidade e as contribuições culturais desses povos.

Em 13 de setembro de 2007, a Assembléia Geral da ONU aprovou a “Declaração sobre os Direitos dos Povos Indígenas”, que, entre outros pontos afirma: 

“Artigo 3 Os povos indígenas têm direito à autodeterminação. Em virtude desse direito determinam livremente sua condição política e buscam livremente seu desenvolvimento econômico, social e cultural. 

Artigo 4 Os povos indígenas, no exercício do seu direito à autodeterminação, têm direito à autonomia ou ao autogoverno nas questões relacionadas a seus assuntos internos e locais, assim como a disporem dos meios para financiar suas funções autônomas. 

Artigo 5 Os povos indígenas têm o direito de conservar e reforçar suas próprias instituições políticas, jurídicas, econômicas, sociais e culturais, mantendo ao mesmo tempo seu direito de participar plenamente, caso o desejem, da vida política, econômica, social e cultural do Estado.”

Pois é, pra que discutir e pensar identidades em um momento em que o país passa por uma crise política aparentemente criada pela polarização e conflitos de time a ou b? 

Parece que, quanto mais se divide, mais específicos e pessoais ficam os problemas sociais, e o que era uma questão da esfera comum (comunidade) e coletiva toma outra forma, mais pessoal e arbitrária. Mas será isso mesmo? 

Será a esfera pessoal tão poderosa e autônoma a ponto de não sofrer nenhum tipo de interferências? Primeiro, é importante lembrar que “dividir para conquistar’’ não é uma ideia nova, e muito menos de autoria nossa, descendentes e habitantes dos territórios colonizados. A divisão “racional”, a catalogação de coisas não nomeáveis (como a cultura e a fé), é uma prática europeia e colonial. 

Então, porque reproduzir essa prática política e colonial de dividir, nomear, racionalizar? Aqui entra bell hooks (1952-2021). No capítulo A língua – Ensinando novos mundos e novas palavras, do seu livro Ensinando a transgredir, a pensadora faz uma reflexão sobre o poema: Queimar papel em vez de crianças, de Adrienne Rich, mais precisamente sobre a frase: “Essa é a língua do opressor, mas preciso dela para falar com você”

Precisamos nos comunicar entre os nossos e com os outros, ainda que em linguagem inicialmente colonizadora. Reforço o inicialmente, pois nada mais indígena do que a ação de aprender com o outro, seja o outro um animal, uma planta, um ecossistema ou outra sociedade, um aprender ativo, reflexivo e respeitoso. 

Mas, se ainda assim, para você essa tática da divisão parece furada, proponho um outro caminho para esse nosso nove de agosto de 2022, proponho um caminho oposto como alternativa, uma prática de aglutinação e soma responsável. Para isso, preciso que você, caro leitor, se faça algumas perguntas simples: 

Será que todo “pardo” é um negro claro? 

Será que todo cabelo liso vem de origem branca? 

Todo olho amendoado é “meio árabe”? 

A qual raça ou etnia cabe os traços de uma família nordestina que não é negra? O soldado amarelo, de Vidas Secas, certamente não era japonês. 

O Brasileiro é realmente um vira-lata caramelo ou uma população de traços e fenótipos Indígenas originários que não se reconhece? 

O nosso distanciamento e a falta de identificação com a Bolívia, Venezuela, Chile e toda a América Latina não é também um dividir? 

Descendentes das populações originárias somos todos nós, os não brancos, mas também os não pretos, que pouco ou nada sabem sobre as suas origens. 

Referências: 

Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade / bell hooks; tradução de Marcelo Brandão Cipolla. – São Paulo : Editora WMF Martins Fontes. 

Vidas secas. Graciliano Ramos, 23. ed. São Paulo: Martins, 1969. 

The Burning of Paper Instead of Children, em The Will to Change: Poems. Adrienne Rich, 1968–1970 (New York: W. W. Norton, 1971), 16. 30.

Declaração sobre os Direitos dos Povos Indígenas

https://www.acnur.org/fileadmin/Documentos/portugues/BDL/Declaracao_das_Nacoes_Unidas_sobre_os_Direitos_dos_Povos_Indigenas.pdf

Texto por Lahayda Dreger